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29/03/2007
No Getsêmani


Visões - No Getsêmani
29/03/2007 17:14:47
Visões - No Getsêmani

MARIA VALTORTA

(Ao chegarmos perto da Semana Santa, seguem abaixo as revelações de Jesus à mística Maria Valtorta, que narram a entrada triunfal e o Getsêmani. Vale a pena meditar sobre isso)

590. O pranto sobre Jerusalém e a entrada triunfal na Cidade Santa.
30 de março de 1947.

Jesus passa um braço por sobre os ombros de sua Mãe, que se levantou, quando João e Tiago de Alfeu a alcançaram, para dizer-lhe: “O teu Filho vem vindo”, e depois voltaram para trás, para se reunirem com os companheiros, que vão andando lentamente, conversando, enquanto Tomé e o André foram correndo a Betfagé, a fim de procurar a jumenta com o jumentinho e levá-los a Jesus.
Enquanto isso, Jesus fica falando com as mulheres. “Eis-nos aqui perto da cidade. Eu vos aconselho que vades com segurança. Entrai antes de Mim na cidade. Perto de Em Rogel estão todos os pastores e os discípulos de mais confiança. Eles receberam a ordem para servir-vos de escolta e dar-vos proteção.”
“É que... Nós já falamos com Azer de Nazaré e com Abel de Belém, e também com Salomão. Eles tinham, vindo até aqui para verem a tua chegada. A multidão prepara uma grande festa. E nós queríamos ver. Estás vendo como se estão sacudindo as copas das oliveiras? Não é o vento que as está agitando desse modo. Mas é o povo que está apanhando ramos para espalha-los pelo caminho e cobrir-te dos raios do sol. E aquilo lá? Olha como estão despojando as palmeiras de seus leques. Parecem ser uns cachos pendurados, mas são homens que subiram pelos fustes das palmeiras, e estão colhendo o mais que podem. E nos declives os meninos estão curvados colhendo flores. E as mulheres certamente estão nos hortos e jardins, apanhando corolas e ervas cheirosas, para encherem de flores o caminho. Nós queríamos ver... e imitar o gesto de Maria de Lázaro, que recolheu todas as flores pisadas por teus pés, quando entraste no jardim de Lázaro”, diz afetuosamente por todas, Maria de Céofas.
Jesus acaricia sobre a face a sua velha parenta, que mais parece uma menina cheia de vontade de ver o espetáculo, e lhe diz: “No meio da grande multidão, não veríeis nada. Ide na frente. Ide à casa de Lázaro, aquela que está sob a guarda de Matias. Eu passarei por lá, e vós me vereis, lá do alto.”
“Meu Filho... e Tu vais sozinho? Não posso estar perto de Ti?”, diz Maria, levantando o seu rosto cheio de tristeza, e fitando seus olhos azuis como o céu, sobre seu doce Filho.
“Eu quereria pedir-te que fiques escondida. Como a pomba na fenda do rochedo. Mais do que da tua presença, o de que eu preciso de ti é da tua oração, minha Mãe querida”.
“Se assim é, meu Filho, nós rezaremos, todas nós, por Ti.”
“Sim. Depois de tê-lo visto passar, ireis conosco para o meu palácio, em Sião. E eu mandarei alguns servos ao Templo, e que irão sempre atrás do Mestre, a fim de que eles nos tragam as ordens dele e suas notícias”, assim decide Maria de Lázaro, sempre alerta para compreender o que é melhor fazer-se, e para fazê-lo sem demora.
“Tens razão, minha irmã. Ainda que eu sofra por não poder acompanhá-lo, compreendo que a ordem é justa. E, afinal, Lázaro nos disse que não contradigamos ao Mestre em nada. E que lhe obedeçamos até nas menores coisas. E assim faremos.”
“Então, ide. Estais vendo? As ruas vão ficando movimentadas. O povo já está quase alcançando os apóstolos. Ide. A paz esteja convosco. Eu vos farei vir nas horas que Eu julgar oportuno. Minha Mãe, adeus. Fica em paz. Deus está conosco.” E a beija, e se despede dela. E as obedientes discípulas lá se vão com cuidado.
Os dez apóstolos alcançam Jesus. “Tu as mandastes para frente?”
“Sim. De alguma casa poderão ver a minha entrada.”
“De qual casa?”, pergunta Judas de Keriot.
“Ora” São... tantas já as casas amigas”, diz Filipe.
“Por que não vão para a da Anália”, insiste Iscariotes.
Jesus responde negativamente, e vai-se encaminhando para
Betfagé, que fica pouco longe.
Ele já vai chegando perto, quando vêm voltando para trás os dois que foram mandados buscar a jumenta e o jumentinho. E eles gritam: “Achamos tudo o que disseste, e te trouxemos os animais. Mas o dono deles quis escová-los e adorná-los com os melhores arreios, a fim de prestar-te uma honra. E os discípulos, unidos aos que passaram a noite nas estradas de Betânia, a fim de te prestarem honras e querem ter a honra de conduzi-los a Ti, e nós consentimos. Pareceu-nos que o amor deles merecia um prêmio.”
“Fizeste bem. Então, vamos para a frente.”
“São muitos os discípulos?”, pergunta Bartolomeu.
“Oh! São uma multidão. Não se consegue nem entrar pelas ruas de Betfagé. Por isso, Eu disse a Isaque que leve o jumento, passando por Cleonte, queijeiro”, responde Tomé.
“Fizeste bem. Vamos até o cume da colina. E lá esperamos um pouco, à sombra daquelas árvores.”
Eles vão para o lugar que Jesus lhes está mostrando.
“Mas assim nos afastamos do caminho. Tu estás à altura de Betfagé, deixando-a para trás!”, exclama Iscariotes.
“E, assim Eu quero fazer, quem e que me pode proibir? Será que Eu já sou um prisioneiro, não me sendo permitido ir para onde quero? E haverá pressa para que Eu o seja, e se teme que Eu possa escapar da captura? E, se Eu julgasse justo afastar-me por lugares mais seguros, haverá quem mo possa impedir?” Jesus dardeja com os seus olhos sobre o traidor, que não abre a boca, e dá de ombros, como se dissesse: “Faze o que te parecer.”
De fato, eles passam por detrás da pequena cidade, eu diria por um subúrbio da cidadezinha, porque do lado oeste estão pouco longe dela, fazendo já parte das encostas do Monte das Oliveiras, que coroa Jerusalém do lado oriental. Lá embaixo, entre os declives e a cidade, as águas do Cedron brilham ao sol de abril.
Jesus se assenta no meio daquele silêncio verde, e se concentra em seus pensamentos. Depois ele se levanta, e vai até a borda do outeiro.
Diz Jesus: “Aqui colocarás a visão de 31 de julho de 1944: “Jesus que chora sobre Jerusalém”, a partir da frase que Eu te disse como começo da visão. Depois Ele continua a mostrar-me as fases de sua entrada triunfal.
30 de julho de 1944.
Não sei como farei para descrever, porque eu me sinto tão mal do coração, que até para ficar sentada sinto dificuldade. Mas é assim mesmo. Eu devo escrever o que vejo. O Evangelho de hoje me ilumina o caminho: hoje é o 9º Domingo depois de Pentecostes.
De uma colina perto de Jerusalém, Jesus olha para a cidade estendida a seus pés. Esta não é uma colina muito alta. No máximo como pode ser a esplanada de São Miniato do Monte, em Florença. Mas é o bastante para que o olho domine sobre a extensão do terreno onde estão as casas e as ruas que sobem e descem pelas pequenas elevações do terreno onde está Jerusalém. Mas esta colina é certamente muito mais alta, se tomarmos por base o nível mais baixo da cidade, não tanto com o Calvário, mas por estar mais perto do muro do que ele. Ela nasce propriamente quase de fora dos muros, e se ergue, com um salto rápido, ao lado dele, enquanto que do outro lado, desce devagar para o campo todo verde, que se estende para o leste. Pelo menos me parece ser o lado do oriente, se eu estiver interpretando bem, pela luz solar.
Jesus e os seus estão debaixo de um grupo de árvores, sentados à sombra delas. Estão descansando do muito que caminharam. Depois Jesus se levanta, deixa aquele espaço cheio de árvores onde estavam sentados, e se dirige para onde desejava ir: para um lado do outeiro. Sua alta estatura se destaca nítida no meio do vazio que o circunda. E ela fica parecendo ser ainda mais alta, estando Ele assim de pé, e sozinho. Ele tem as mãos cruzadas sobre o peito, por cima do manto azul, e está olhando sério, muito sério.
Os apóstolos o estão observando. Mas o deixam tranqüilo, não se movem nem falam. Devem estar pensando que Ele veio sozinho para rezar.
Mas Jesus não está rezando. Depois de ter ficado olhando de
lá para a cidade em todos os seus bairros, em suas elevações, em suas particularidades, de vez em quando lança demorados olhares sobre este ou aquele ponto e outras vezes com menor duração. E Ele se põe a chorar, sem sacudir-se nem fazer barulho. Suas lágrimas enchem as órbitas, depois escorrem, e vão descendo por sobre as faces, e caem, por fim. São grandes lágrimas, silenciosas e muito tristes. São lágrimas como as de quem sabe que deve chorar, sozinho, sem esperar o consolo nem a compreensão de ninguém. Por uma dor, que não pode ser anulada, e que deve ser sofrida, incondicionalmente.
O irmão de João, por sua colocação, é o primeiro que vê aquele pranto e fala dele aos outros. Eles olham um para o outro, surpresos.
“Nenhum de nós lhe fez mal”, diz um deles. E um outro diz: “Não foi ninguém da multidão que o insultou. Pois não havia no meio dela nenhum inimigo dele.”
“E, então, por que Ele está chorando?”, pergunta o mais velho de todos.
Pedro e João se levantam, ao mesmo tempo, e se aproximam do Mestre. Pensam que a única coisa que podem fazer seria fazê-lo ouvir que o amam, e perguntar-lhe o que houve.
“Mestre, Tu estás chorando?”, diz João, pousando sua cabeça loura sobre o ombro de Jesus que é mais alto do que ele, da base do pescoço para cima.
E Pedro, pondo-lhe a mão na cintura, e apertando-o, como se o abraçasse, puxa-o para si, e lhe diz: “Que é que te faz sofrer. Jesus? Dize-o a nós, que te amamos.”
Jesus apóia a face sobre a cabeça loura do João e abrindo os braços passa por sua vez, o braço sobre o ombro do João. Ficam assim abraçados todos os três, em uma postura de muito amor. Mas o pranto continua a gotejar. João o percebe descer por entre seus cabelos, e torna a perguntar: “Por que estás chorando, Mestre meu? Será que nós é que te fazemos sofrer?”
Os outros apóstolos se reuniram ao grupo amoroso, e com ansiedade esperam uma resposta.
“Não”, diz Jesus. “Não sois vós. Vós sois meus amigos, e a amizade, quando é sincera, é um bálsamo e um sorriso, mas nunca um pranto. Eu gostaria que vós permanecêsseis sempre meus amigos. E principalmente agora, quando vamos entrar na corrupção que fermenta, que corrompe a quem não tem a vontade decidida de permanecer honesto.”
“Para onde vamos, Mestre? Não é para Jerusalém? A multidão já te saudou com alegria. Queres desiludi-la? Será que vamos a Samaria ver algum milagre? E justamente agora, que a Páscoa está perto?”
As perguntas são feitas por muitos ao mesmo tempo. Jesus levanta as mãos para impor silêncio e depois, com a mão direita, mostra a cidade. É um gesto largo como o do semeador, que joga as sementes para a frente de si. Ele diz: “Ali está a corrupção. Nós estamos entrando em Jesrusalém. Estamos entrando. E somente o Altíssimo é que sabe como Eu quereria santificá-la de novo a esta que já deveria ser a Cidade Santa. Mas não poderei fazer nada mais para ela. Está corrompida, e corrompida irá ficar. E os rios da santidade, que jorram do Templo vivo, ainda mais jorrarão por alguns dias, até deixá-lo vazio de vida, não sendo eles suficientes para redimi-la. Virá ao Santo a Samaria e o mundo pagão. Sobre os templos mentirosos surgirão os templos do verdadeiro Deus. Os corações dos gentios adorarão o Cristo. Mas este povo, esta cidade será sempre inimiga dele, e o seu ódio ao maior dos pecados. Isto deve acontecer. Mas, ai daqueles que vão ser instrumentos desse delito. Ai deles!...” Jesus olha fixamente para o Judas, que está quase à sua frente.
“Isto a nós não acontecerá nunca. Nós somos os teus apóstolos e cremos em Ti, e estamos dispostos a morrer por Ti.” Judas mente despudoradamente, e não abaixa o olhar, ainda que sinta que o olhar de Jesus continua sobre ele... Os outros protestam todos juntos.
Jesus responde a todos, mas evita responder ao Judas diretamente.
“Queira o céu que vos sejais assim. Mas ainda há muita fraqueza em vós... e a tentação poderia tornar-vos semelhantes àqueles que me odeiam. Rezai muito, e velai muito sobre vós. Satanás sabe
que está para ser vencido, e quer vingar-se, afastando-vos de Mim. satanás está ao redor de todos nós. Ao redor de Mim, para impedir me de fazer a vontade do Pai e de cumprir a minha missão... E de vós para fazer de vós servos seus. Vigiai. Do lado de dentro daqueles muros, Satanás pegará aquele que não souber ser forte. Aquele para o qual a maldição terá sido o ter ele sido escolhido, porque ele fez dessa escolha um plano humano. Eu vos escolhi para o Reino dos Céus, e não para o do mundo. Lembrai-vos disso. E tu, cidade que queres a tua ruína, e sobre a qual Eu choro, fica sabendo que o Cristo ora pela tua redenção. Oh! Se pelo menos nesta hora que te resta souberes vir a quem seria a tua paz! Pelo menos que compreendesses nesta hora o Amor que está passando no meio de ti, e te despojasses do ódio que te torna cega e louca, cruel para contigo mesma, e para com o teu bem! Mas dia virá em que te lembrarás desta hora! Já será tarde demais, então, para chorares e te arrependeres. O Amor terá passado, e terá desaparecido de tuas estradas, e só ficará o ódio, que foi o preferido por ti. E o ódio se porá contra ti, e contra os teus filhos. Porque tem-se aquilo que se quis e ódio se paga com ódio. E não será mais o ódio dos fortes contra o desarmado. Mas ódio contra ódio e, por isso, guerra e morte. Cercada por trincheiras e homens armados, já terás definhado, mesmo antes de seres destruída, e verás caindo os teus filhos pelas armas e pela fome, e os que sobreviverem serão levados como prisioneiros e escarnecidos, e, então, tu pedirás misericórdia, mas não a encontrarás mais, porque te recusaste a reconhecer a tua Salvação. Eu choro, meus amigos, porque Eu tenho um coração de homem, e por isso as ruínas da Pátria me fazem chorar. Mas é justo que isso se cumpra, pois a corrupção campeia do lado de dentro destes muros, e passa acima de todos os limites, atraindo o castigo de Deus. Ai dos cidadãos que são causa do mal da Pátria. Ai dos reitores, que são a causa principal disso. Ai daqueles que deveriam ser santos, para levarem os outros a serem honestos, pois, ao contrário disso, eles estão profanando a casa do seu ministério e a si mesmos! Vinde. Minha ação nada mais valerá. Mas façamos que a Luz brilhe, ainda uma vez, no meio das Trevas!”
e Jesus vai descendo, acompanhado pelos seus. Vai, andando depressa pelo caminho, com um rosto sério, e, eu diria, quase fechado. Ele nem fala mais. Entra em uma casinha, aos pés da colina, e eu não vejo nada mais.
Diz Jesus:
A cena narrada por Lucas parece desconexa, quase sem lógica. Eu que me compadeço das desventuras de uma cidade culpada, e não saberei compadecer-me dos costumes desta cidade? Não. Não os conheço, e não me posso compadecer deles, pois que, pelo contrário, são esses próprios costumes que geram as desventuras. E, ao vê-las, torna-se para mim mais aguda a minha dor. A minha ira contra os profanadores do Templo e uma lógica conseqüência da minha meditação sobre as próximas desventuras de Jerusalém.
São sempre as profanações do culto de Deus, da Lei de Deus, que provocam os castigos do Céu. Fazendo da Casa de Deus uma espelunca de ladrões, aqueles sacerdotes indignos e aqueles crentes indignos, pois o são somente de nome, atraiam sobre todo o povo maldição e morte. É inútil dar este ou aquele nome ao mal que faz um povo sofrer. Procurai o nome justo, que é este: “Punição por viverem como uns brutos”. Deus se retira, e o Mal avança. Eis o fruto de uma vida nacional indigna do nome de cristã.
Como naqueles tempos, também agora, neste fim de século, não tenho faltado com prodígios, que fazem estremecer e reclamar... Mas, hoje como ontem, Eu não atraí sobre Mim e sobre meus instrumentos nada mais, do que escárnio, indiferença e ódio. Cada um em particular e as nações recordem-se de que inutilmente choram quando, antes, não quiseram conhecer sua salvação. Inutilmente me invocam, quando no tempo em que Eu estava com eles, eles me perseguiram com uma guerra-sacrílega que, partindo das consciências individuais, devotadas ao Mal, espalhou-se p
or toda a Nação. As Pátrias não se salvam somente com as almas, mas também com uma forma de vida, que atraia as proteções do Céu.
Repousa, pequeno João. E faze por onde sejas sempre fiel e tua escolha. Vai em paz.
Que cansaço. Não agüento mais...”
597. Quarta-feira de noite no Getsêmani com os apóstolos
8 de março de 1945.
“Eu vos disse: “Ficai atentos, vigiai e orai, para que não sejais vencidos pelo sono. Mas estou vendo que vossos olhos cansados querem fechar-se e que os vossos corpos, mesmo sem o quererdes, procuram posições de descanso. Tendes razão, meus pobres amigos! O vosso Mestre muito exigiu de vós nestes dias, e vós estais muito cansados. Mas, daqui a poucas horas, vos sentireis contentes, por não terdes perdido nem um momento para estardes longe de Mim. Contentes estareis por não terdes recusado nada ao vosso Jesus. Em resumo, é esta a última vez que Eu vos falo destas coisas tristes. Amanhã Eu vos falarei do amor, e farei para vós um milagre todo de amor. Preparai-vos com uma grande purificação para recebe-lo. Oh! Quanto é mais consoante para Mim mais falar de amor do que de castigo! Como é doce dizer: “Eu vos amo. Vinde. Durante toda a minha vida, sonhei com esta hora!” Mas, até o falar em morte é amor. Durante toda a minha vida, sonhei com esta hora!” Mas até o falar em morte é amor. n amor, quando a morte, para aqueles que vos amam é a suprema prova de amor. É amor, porque preparar os amigos queridos para a desventura é uma previdência afetiva, que deseja vê-los prontos, e não apavorados naquela hora. É amor, porque confiar um segredo e uma prova de estima, que se tem para com aqueles aos quais ele é confiado. Eu sei que vós atormentastes com perguntas ao João, quando queríeis saber o que foi que Eu lhe disse, quando fiquei sozinho com ele. E não acreditastes que não houve palavras entre nós. Mas assim foi. Para Mim bastou ter perto de Mim uma criatura.”
“Então, por que havia de ser ele, e não outro?”, pergunta Iscariotes e pergunta com uma arrogância cheia de ira.
Até Pedro, e com ele Tomé e Filipe dizem: “Sim. Por que a ele, e não aos outros?”
Jesus responde a Iscariotes: “Terias gostado que fosse tu? E podes pretender isso?
Era aquela uma fresca e serena manhã do mês de Adar... Eu era um desconhecido viandante que ia pela estrada de perto do rio... Cansado, empoeirado, pálido por estar em jejum, com a barba descuidada, as sandálias rotas, parecendo um mendigo pelos caminhos do mundo... Ele me viu... E me reconheceu como sendo aquele sobre o qual havia descido a Pomba do fogo eterno. Naquela minha primeira tranfiguração, certamente um raio do meu divino esplendor deve ter-se manifestado. Os olhos abertos pela Penitência do Batista e os que foram conservados angelicais pela Pureza, viram o que os outros não viram. E os olhos puros guardaram aquela visão nos tabernáculos de seus corações, e a encerraram, como uma pérola em um escrínio... Quando se levantaram, depois de terem estado quase dois meses sobre o esfarrapado viandante, a alma dele me reconheceu... E Eu era o seu amor. O seu primeiro e único amor. E o primeiro e único amor nunca se esquece. A alma percebe quando ele chega, mesmo que ele se tenha afastado, e o percebe chegar, vindo das distâncias mais longínquas, e pula de alegria, desperta a mente, e esta desperta a carne, para que todos participem do banquete da alegria de se encontrarem e de se amarem. E, com a boca tremente, ele me disse: “Eu te saúdo, ó Cordeiro de Deus!”
Oh! A fé dos que são puros, como és grande! Como superas todos os obstáculos! Ele não sabia o meu Nome. Quem era Eu? De onde é que Eu vinha? Que é que Eu fazia? Era Eu pobre? Era sábio? Era ignorante? Será que Ele faz saber tudo pela fé? Ele aumenta ou diminui por saber? Ele acreditava em tudo o que havia dito o Precursor. Como uma estrela que transmigra de uma para outra parte do céu, ele se havia separado do seu céu, o Batista, e saído de sua constelação, e ido para o seu novo céu, o Cristo, da constelação do Cordeiro. Ele não é a estrela maior
, mas é a mais bela constelação do amor.
São passados três anos, desde aquele tempo. Estrelas e estrelinhas se uniram e depois se afastaram da minha constelação. Umas se precipitaram e morreram, outras ficaram enfumaçadas por pesados vapores. Mas permaneceu fixo, com sua luz pura, junto de sua Polar.
Deixai-me olhar sua luz. Duas serão as luzes nas trevas do Cristo: Maria e João. Mas quase não poderei vê-las, por tão grande que vai ser a dor. Deixai que Eu imprima em minha pupila estes quatro íris, que são fímbrias de Céu, por entre cílios louros, para que Eu os leve comigo para onde ninguém poderá ir, como uma lembrança de pureza. Todo o pecado, todo sobre as costas do Homem. Oh! Oh! Os três náufragos que emergem do naufrágio de uma humanidade no mar do Pecado.
Será, então, a hora em que Eu, o rebento da estirpe de Davi, gemerei ao dar o antigo suspiro de Davi: “Meu Deus, volta-te para mim. Por que me abandonaste? De Ti me afastam os gritos dos delitos, que Eu assumi em lugar de todos... Eu sou um verme, e não mais um homem, sou o opróbrio dos homens, o rebotalho da plebe.”
E ouvi Isaías: “Abandonei meu corpo aos perseguidores, as minhas faces a quem me arrancava a barba e a quem me ultrajava e me cobria de escarros.”
Ouvi de novo Davi: “Muitos novilhos me rodearam, muitos touros me atacaram. Sobre Mim eles abriram suas bocas para me devorarem, como uns leões, que despedaçam e rugem. Eu me vi dissolvido, como água.”
E Isaías completa: “Eu mesmo tingi as minhas vestes.” Oh! As minhas vestes, Eu mesmo as tinjo, não com o meu furor, mas com a minha dor e o meu amor por vós. Como as duas pedras chatas da prensa, eles me comprimem, e espremem o meu sangue. Não sou eu diferente do cacho prensado, que entrou todo bonito na prensa, e depois vira uma papa espremida, sem suco e sem beleza.
E o meu coração, eu falo como Davi: “torna-se como a cera, e se derrete dentro do meu peito”. Oh! Coração perfeito do filho do homem, que te tornaste agora? Está parecido com aquele que uma longa vida de pândega faz que fique desfeito e sem vigor. Todo o meu vigor se esgotou. Minha língua está pegada ao céu da boca, por causa da febre e da agonia. E a morte me pega de surpresa, com sua cinza que asfixia e cega.
E, além disso, ela não tem piedade! Um bando de cães me cerca e me morde. E sobre as feridas recebo outras mordidas. E por cima das mordidas, recebo as bordoadas. Nenhuma parte de meu corpo fica sem dor. Meus ossos rangem, deslocados por um alongamento criminoso. Não sei onde apoiar o meu corpo...”
A horrorosa coroa é um círculo de fogo, que penetra na cabeça. Estou pendurado pelas mãos e pelos pés transfixados. E assim sou elevado, e apresento o meu corpo ao mundo, e todos podem contar os meus ossos...”
“Cala-te! Cala-te”, soluça João.
“Não fales mais, que nos fazes entrar em agonia”, suplicam os primos.
André não fala, mas pôs a cabeça entre os joelhos, e chora sem fazer barulho. Simão está lívido. Pedro e Tiago de Zebedeu parecem estar sendo torturados. Filipe, Tomé, Bartolomeu parecem três estátuas de pedra, com uma expressão de angústia.
Judas é uma máscara macabra, demoníaca. Parece um condenado que finalmente compreendeu o que fez. Com a boca aberta, depois de um urro que de dentro dele quer sair, mas que continua fechado na garganta, ele, com os olhos dilatados e cheios de pavor, como os de um louco, com as faces cor da terra, por baixo do véu amorenado de uma barba rala, com os cabelos despenteados, porque sempre os desarruma com a mão, suado e confundido, parece estar quase desfalecendo.
Mateus, tendo levantado o olhar, a fim de procurar quem o ajude em seu tormento, vê o que está acontecendo, e diz: “Judas, estás mal?... Mestre, Judas está sofrendo!”
“Eu também”, diz Jesus. “Mas Eu sofro em paz. Tornai-vos espíritos, a fim de poderdes suportar esta hora. Alguém que foi carne, não poderá vive-la sem enlouquecer...
Fala ainda Davi, ao ver as torturas do seu Cristo: “Ainda não estão contentes e olham p
ara Mim escarnecendo de Mim e repartindo entre si minhas vestes e tirando a sorte para ver quem vai ficar com minha túnica. Eu é que sou o malfeitor. É o direito deles.”
Oh! Terra, olha o teu Cristo! Procura saber reconhece-lo, ainda que Ele esteja tão desfigurado. Escuta, lembra-te das palavras de Isaías, e procura compreender o porquê, grande porquê. Ele ficou assim, e o homem foi capaz de matá-lo, reduzindo a esse estado o Verbo do pai. Ele não tem beleza, nem esplendor. Nós o vimos. Não era de belo aspecto. E não o amamos. Foi desprezado como o último dos homens. Ele o Homem das dores, acostumado a padecer, estava com o rosto escondido. Era vilipendiado, e nós não fizemos conta alguma dele.” Sua beleza de Redentor era essa máscara de torturado. Mas tu, ó Terra estulta, ainda preferias ver o seu rosto sereno!
“Verdadeiramente Ele tomou sobre si os nossos males e levava as nossas dores. E nós olhávamos para Ele como para um leproso, como para alguém amaldiçoado por Deus, para um desprezado. E, no entanto, se ele foi coberto de feridas, assim o foi por causa de nossas perversidades. Sobre Ele caiu o castigo, que estava reservado para nós, o castigo que nos deveria pôr de novo em paz com Deus. Pelos sinais de suas equimoses é que ainda fomos salvos. Nós éramos como umas ovelhas errantes. Cada um de nós se havia desviado do caminho reto, e o Senhor pôs nas costas dele as iniqüidades de todos.”
Aquele e aqueles que pensam terem ajudado a si mesmos e a Israel, tratem de desiludir-se. E também aqueles que julgam terem sido mais fortes do que Deus. E também os que pensam que não terão que prestar contas por esse pecado porque Eu me deixo matar de boa vontade. Eu cumpro a minha santa tarefa, a da perfeita obediência ao Pai. Mas isso não exclui a obediência deles a Satanás, nem que deixem de pôr em prática o seu plano nefando.
Sim. O teu Redentor foi sacrificado porque Ele o quis, ó terra. “Ele não abriu a boca para dizer alguma coisa, pedindo para ser poupado, nem uma palavra de maldição contra os seus assassinos. Como uma ovelhinha que se deixou conduzir até o matadouro para ser morta, como um cordeirinho que é levado a quem o vai tosquiar.”
Depois da captura e da condenação, Ele foi levantado. Ele não terá posteridade. Como uma planta, Ele será cortado da terra dos vivos. Deus o feriu por causa do pecado do seu povo. “Não haverá na Terra alguém de sua geração que se compadeça dele? Não terá filhos, esse que foi cortado em sua vida na terra?”
Oh! Eu te respondo, ó profeta, sobre o teu Cristo. Se o meu povo não tiver compaixão do que foi morto sem culpa, os anjos, que são o povo celeste, se compadecerão dele. Se a virilidade dele não terá filhos humanamente, porque sua natureza não podia encontrar união com carne mortal, Ele bem que terá filhos, e filhos segundo um modo de gerar, que não é o da carne e do sangue animal, mas do amor e do Sangue divino Ele terá vida, uma geração do espírito, pela qual há de ter a tua prole.
E Eu ainda te explico, ó mundo que não entendes o profeta, quem são os ímpios que foram levados à sepultura, e quem é o rico em sua morte. Olha, ó mundo, olha se um só dos teus matadores, por acaso teve paz e longa vida! Ele, o Vivente, brevemente irá deixar a morte. Mas, como as folhas que o vento do outono ajunta, uma por uma, nos sulcos, depois de tê-las arrancada com repetidas sacudidas, e todas forem ajuntadas na ignóbio sepultura que para ele havia sido destinada, e um que pelo ouro viveu poderia, se lícito fosse colocar o imundo onde esteve o Santo, para ser deixado onde ainda estiver a umidade provinda das inumeráveis feridas da Vítima que foi imolada sobre o Monte. Tendo sido acusado sem ter culpas, Deus faz por ele a sua justiça. Pois nunca houve fraude em sua boca, nem iniqüidade em seu coração.
Consumido pelos sofrimentos. Mas da consumação terminada de uma vida cortada em um sacrifício de expiação, aí é que teve início a sua glória entre os membros da futura humanidade. Todos os desejos e as santas vontades de Deus para com ele se
rão levados a efeito. Pelas ânsias de sua alma, verá a glória do verdadeiro povo de Deus, e com isso ficará feliz. A sua doutrina celeste, que Ele selará com seu sangue será a justificação de muitos, que não estão entre os melhores, e dos pecadores tirará a iniqüidade. Por isso, haverá uma grande multidão, ó terra, e ao redor deste Rei desconhecido, do qual os pérfidos zombaram, e que os melhores não compreenderam. E Ele, então, dividirá com os seus os despojos dos vencidos. Dividirá os despojos dos fortes, como único Juiz dos três reinos e do Reino.
Tudo Ele mereceu, porque tudo deu. Tudo lhe será entregue, visto que Ele entregou sua vida à morte, e foi contado junto com os malfeitores. Ele era sem pecado. Sem outro pecado, a não ser um perfeito amor, uma infinita bondade. São duas culpas que o mundo não perdoa: um amor e uma bondade que o levaram a tomar sobre Si os pecados de muitos, do mundo todo, e a rezar pelos pecadores. Por todos os pecadores. Até por aqueles pelos quais Ele foi condenado à morte.
Terminei. Não tenho nada mais a dizer. Tudo está dito sobre o que Eu queria dizer-vos sobre as profecias messiânicas. Do nascimento até à morte, Eu vo-las apresentei todas, a fim de que Me conhecêsseis, e não ficásseis em dúvida. E não tivésseis desculpas para o vosso pecado.
Agora, vamos rezar juntos. É esta a última tarde em que podemos rezar juntos, todos unidos como os bagos no cacho que os segura. Vinde. Vamos rezar. “Pai nosso que estás nos Céus, santificado seja o teu Nome. Venha o teu Reino. Seja feita a tua vontade na Terra, como é feita no Céu. Dá-nos hoje o pão nosso de cada dia. Perdoa-nos as nossas dívidas, como nós as perdoamos aos nossos devedores. Não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. Amém.”
Seja santificado o teu Nome. Pai, Eu o santifiquei. Tem piedade do teu Rebento.
“Venha o teu Reino.” Para fundá-lo é que Eu morro. Piedade de Mim.”
“Seja feita a tua vontade.” Socorre a minha fraqueza. Tu, que criaste a carne do homem, e dela revestiste o teu Verbo, para que Ele aqui embaixo te obedeça, como sempre te tenho obedecido no Céu. Tem piedade do Filho do homem
“Dá-nos o pão”... Um pão para a alma. Um pão, não desta terra. Não é para Mim que Eu o peço. E não tenho mais necessidade, senão do teu conforto espiritual. Mas por ele, Eu como um Mendigo, te estendo a mão. Daqui, a pouco ele será transfixada e fincada, e não poderá mais fazer um gesto de amor. Mas agora ainda pode. Pai, concede-me que Eu possa dar a eles o pão que cada dia fortifique a fraqueza dos pobres filhos de Adão. Eles são fracos, ó Pai eles não têm força, porque não possuem o Pão, que é força, o Pão dos anjos que espiritualiza o homem e o leva a ser divinizado em Nós.
“Perdoa-nos as nossas dívidas...”
Jesus, que até aqui falou de pé e rezou de braços abertos, agora se ajoelha, levanta os braços e o rosto para o Céu, um rosto alvejado pela força feita, ao suplicar, e pelo beijo da lua, acompanhado por um pranto silencioso.
“Ao teu Filho perdoa, ó Pai, se em alguma coisa Ele faltou para contigo. Diante de tua perfeição, posso até parecer imperfeito, Eu, o teu Cristo, que a carne torna pesado. Aos homens... não. O meu intelecto me assegura que tudo isso Eu fiz por eles. Mas Tu, perdoa ao teu Jesus... Eu também perdôo. Quanto eu terei que perdoar! Quanto! Mas eu perdôo. A estes aqui presentes, aos discípulos ausentes, aos surdos de coração, aos inimigos, aos que escarnecem de Mim, aos traidores, aos assassinos, aos deicidas. Aí está. Perdoei a toda a Humanidade. Por Mim, ó Pai, considere anuladas todas as dívidas do homem para com o Homem. Eu morro para dar a todos o teu Reino, e não quero que fique anotado para a condenação o pecado contra o Amor Encarnado. Não? Tu dizes não? É a minha dor. Este “não” me infunde no coração o primeiro trago do cálice atroz. Mas, o Pai, a quem sempre obedeci, Eu te digo: “Seja feito como Tu queres.”
“Não nos deixes cair em tentação”. Oh! Se Tu queres, podes afastar de nós o demônio! Ele é a tentação que e
xcita a carne, mente, o coração. Ele é o Sedutor. Afasta-o, ó Pai. Que o teu arcanjo esteja a nosso favor! Para afugentar aquele que, desde o nosso nascimento até a morte, nos arma ciladas!... Oh! Pai Santo, tem piedade dos teus filhos!
“Livra-nos, livra-nos do mal” Tu o podes fazer. A nós que aqui ficamos chorando... É tão belo o Céu, e temos medo de perdê-lo. Tu dizes: “O meu Santo não o pode perder”. Mas Eu quero que Tu vejas em Mim o Homem, o Primogênito dos homens. Eu sou irmão deles. Eu rezo por eles e com eles. Pai, piedade! Oh! Piedade!...”
Jesus se inclina para o chão. Depois se ergue: “Vamos. Saudemo-nos nesta tarde. Amanha pela tarde não nos será mais possível...
E os beija, um por um, a começar por Pedro, depois Mateus, Simão, Tomé, Filipe, Bartolomeu, Iscariotes, os dois primos, Tiago de Zebedeu, André e, por último, João, ao qual depois Ele fica apoiado, enquanto vão saindo do Getsêmani.
(Gentileza, Conceição)




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