Documento pede a todas as mulheres contemplativas para abraçar a agenda social dos Papas pós-conciliares, que evita a oração para a conversão à fé católica e o principal objetivo da vida contemplativa no passado: transformarem-se em almas vítimas para aplacar a justa ira de Nosso Senhor pelos pecados dos indivíduos e das nações
Marian T. Horvat, Ph.D. – Tradition In Action | Tradução Sensus fidei: A última Constituição Apostólica de Francisco sobre a Vida Contemplativa Feminina é muito mais revolucionária do que pode parecer à primeira vista. Talvez seja por isso que não recebeu a atenção que merece dos meios de comunicação católicos, que geralmente tentam evitar relatar os frutos mais destrutivos do Vaticano II.
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Intitulada Vultum Dei Quaerere (VDQ), ela conclama as mulheres de vida religiosa em ordens contemplativas ao redor do mundo para regulamentar os seus estilos de vida e reescrever suas constituições para melhor conformidade com as orientações do Vaticano II e a mudança dos tempos modernos. O comunicado de imprensa do Vaticano admite claramente que VDQ é uma “chamada para implementar mudanças” em 12 áreas da tradição monástica, de formação para o claustro e o ascetismo. A longo prazo, é uma completa reestruturação das ordens religiosas contemplativas.
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O documento é curto, se considerarmos a prolixidade de outros documentos de Francisco, apenas 21 páginas. Apesar de muitos elogios e louvores para com a vida contemplativa, o tom da Vultum Dei Quaerere é claro: Todas as religiosas católicas nas comunidades contemplativas — e isso significa absolutamente tudo: clausura, semi-clausura, aquelas que se dedicam principalmente à oração, etc. — devem oficialmente “ficar com” o programa do Vaticano II e empenharem-se ativamente na adaptação ao mundo moderno. (Art VDQ 2:. §1)
Não há mais exceções ou desculpas como “seguimos o especial carisma da ordem”. O movimento em direção a centralização e modernização está mandatado pelo próprio Sumo Pontífice e aplica-se a cada ordem sob sua jurisdição, incluindo as instituições contemplativas femininas tradicionalistas — aquelas ligadas à Fraternidade São Pedro, o Instituto de Cristo Rei, o Instituto Bom Pastor e, em breve, para aquelas que dependem da Sociedade de São Pio X, quando o seu estatuto for oficializado em Roma.
Proibitivamente, Francisco começa ditando que VDQ revoga e excede todos os documentos passados com as normas que regem a vida das mulheres contemplativas religiosas, incluindo o Código de Direito Canônico de 1983. Para fazer com que o comando seja cristalinamente claro, ele enumera especificamente os documentos mais relevantes que começam com a Constituição Apostólica Sponsa Christi de Pio XII (1950) para a Instrução do Vaticano Verbi Sponsa (1999) sobre a vida contemplativa e clausura das freiras. (Art VDQ. 1)
Portanto, com um movimento de mão, Francisco declara que:
Todas as mulheres contemplativas de ordens religiosas devem rever os seus objetivos e reescrever suas constituições para estar em maior conformidade com o Vaticano II;
- Todas as normas e regulamentos anteriores que regem contemplativas, incluindo o Direito Canônico, são anuladas.
- As mulheres religiosas de ordens contemplativas devem submeter-se inquestionavelmente à VDQ e aguardar outro conjunto de diretrizes que virão.
- Estas novas constituições, uma vez adaptadas às novas orientações, ainda a serem emitidas pela Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, devem ser aprovadas pela Santa Sé. (Art VDQ 14:. §2)
Cardeal Avis insiste que todas as mulheres religiosas devem estar inseridas no mundo moderno, no espírito do Concílio Vaticano II
Deve-se notar aqui que o designado para emitir essas normas é o cardeal brasileiro, João Braz de Aviz, o chefe da Congregação do Vaticano para a vida religiosa. Cardeal Aviz não faz segredo de que ele acredita que todas as ordens religiosas devem viver suas vidas mais “inseridas” no mundo.
Dirigindo-se a diretores de formação religiosa em um Congresso de Roma em 2015, ele disse palavras duras contra os religiosos que tentam evitar as mudanças na Igreja trazidas pelo Concílio Vaticano II.
“Na verdade, aqueles que estão se distanciando do Concílio para fazer um outro caminho estão se matando — mais cedo ou mais tarde, eles irão morrer”, disse Braz de Aviz. “Não tem sentido. Estarão fora da Igreja. Precisamos construir, utilizando o Evangelho e o Concílio como pontos de partida.” (National Catholic Reporter “Cardinal to religious: Those who abandon Vatican II are killing themselves”, 09 de abril de 2015)
Este é o cardeal escolhido por Francisco para a emissão e regulamentação das próximas normas específicas que irão direcionar as mulheres religiosas contemplativas na sua tarefa de adaptação ao mundo moderno. Eu acredito que se pode razoavelmente dizer que isso não augura nada de bom para as ordens mais tradicionais e conservadoras que têm vindo a crescer nas últimas décadas.
Participação na liturgia & nova agenda social
Enquanto Francisco elogia “a vida de especial consagração”, ele também insiste que estas mulheres religiosas tornam-se “mulheres de nosso tempo.” (VDQ n. 2) Para isto, ” merecem uma atenção particular os grandes documentos do Concílio Vaticano II: a Constituição dogmática sobre a Igreja Lumen gentium e o Decreto sobre a renovação da vida religiosa Perfectae caritatis“.
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A primeira delas, com efeito estabelece uma nova definição da Igreja como “Povo de Deus”, promove a noção protestante do sacerdócio dos fiéis e faz uma chamada teórica para a santidade, mas, na prática, exalta a vida de serviço acima de todas as outras coisas.
Como isso se traduz em transformar a vida das contemplativas? Mais participação na liturgia como “povo de Deus”, é claro, e uma oração voltada para a melhoria da humanidade vs. o louvor de Deus.
VDQ efetivamente pede a todas as mulheres contemplativas para abraçar a agenda social dos Papas pós-conciliares, que evita a oração para a conversão à fé católica e o principal objetivo da vida contemplativa no passado: transformarem-se em almas vítimas para aplacar a justa ira de Nosso Senhor pelos pecados dos indivíduos e das nações.
Uma nova orientação é apresentada: estas orações de intercessão oferecidas devem também estender-se “por tantos irmãos e irmãs presos, migrantes, refugiados e perseguidos, por tantas famílias feridas, pelas pessoas sem trabalho, pelos pobres, os doentes, as vítimas das várias dependências…”. Ou seja, as irmãs contemplativas estarão mudando o seu foco de oração, que consiste em rezar para a conversão e a salvação das almas, focando agora as suas orações em favor do bem-estar social e da saúde dos corpos. (N. 16)
Elas podem “sujar as mãos”, como este Papa parecido com barro gosta de dizer, indo em oração para os lugares mais miseráveis e imundos. As religiosas contemplativas são assim convidadas a juntar-se às ordens seculares, que desde o Vaticano II assumiram a missão de ajudar a humanidade a ter uma vida melhor, desconsiderando a própria fé ou falta de fé, e para destruir as “estruturas de pecado” do capitalismo.
Atualmente, como a lectio divina (leitura divina) “é recomendada a todo o povo de Deus “, os contemplativos devem fazer mais para partilhar a sua “experiência transformadora da Palavra de Deus”, com outros religiosos e leigos. “Senti esta partilha como uma verdadeira missão eclesial”, instrui Francisco. (N. 19)
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Esta partilha deve estar especialmente presente na liturgia, onde Francisco enfaticamente exorta as irmãs a “evitar o risco duma abordagem individualista” e, em vez disso, construir a “comunhão”. Uma vez que a Eucaristia é o coração da vida consagrada e, em seguida, para este mistério profundo ter lugar e brilhar em toda a sua riqueza, “cada” celebração “deve ser cuidadosamente preparada” e “todos devem participar plenamente, com fidelidade e conscientemente”. (n. 22)
É uma chamada para uma plena “participação” do “povo de Deus” — incluindo as contemplativas consagradas — na Missa, agora identificada como “a Eucaristia.” As irmãs também devem tirar proveito da “renovação bíblica” estimulada pelo Vaticano II, utilizando os novos métodos e “a hermenêutica existencial da Sagrada Escritura” em suas leituras bíblicas e orações (Ofício Divino).
Mas isso é mais do que apenas uma chamada para a participação, a DVQ determina que: “as celebrações da Comunidade devem ser avaliadas “para ver se são verdadeiramente um encontro vivo com o Senhor” (Art. 4 § 2) Este documento estabelece novas federações e terá a palavra final sobre o assunto, forçando efetivamente as ordens tradicionalistas ao cumprimento em conformidade com a participação. Apenas o propositalmente ingênuo ou simplório poderia imaginar de forma diferente.
No próximo artigo, vou olhar para as disposições da VDQ sobre a formação de irmãs e a centralização das comunidades contemplativas, colocando-as em federações que garantam a conformidade com o espírito do Vaticano II.